"“Para onde olhar?”, pergunta Creonte, mesmo no final de Antígona, a tragédia com que Sófocles encerra a sua Trilogia Tebana.
“Para onde olhar?”, pergunta o rei, quando à sua volta se vê só morte e desolação: mortos estão Eurídice, sua mulher, e Hémon, seu filho, morta está sua sobrinha Antígona, e é de um mundo de sangue derramado pelas mortes de Polinices e Etéocles, irmãos de Antígona, que a cidade de Tebas acaba de emergir.
E todavia, Tirésias, o profeta cego, a quem todos os prazeres são, ao mesmo tempo, proibidos e permitidos, mostrara‑lhe, na cegueira, o caminho da visão. É na cegueira que Tirésias vê o que Creonte, com olhos sãos (ao contrário de Édipo, que os vazara), não vislumbra. E é a cegueira, herdada dessa linhagem tocada pela tragédia, a de Édipo, que Antígona repele e, ao mesmo tempo, acolhe.
O lamento de Antígona: “Vede, ó príncipes de Tebas, vede a herdeira da casa real, vede o que eu sofro da parte destes homens”. Antígona, cujo gesto de desafio ao pretender dar igual sepultura ao corpo do irmão banido prevê reflexões modernas sobre o desigual valor das vidas e dos corpos. E do chorar as mortes."
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“Olhai! Do mesmo sangue / é quem morreu e quem matou”
Ana Luísa Amaral
""Estamos sós com tudo aquilo que amamos."
Novalis
O ensaio de Antígona, a que ontem assisti, desde o início que me evocou Novalis.
Quando, pouco antes da primeira intervenção do Coro, Ismena diz à irmã: “Mas, então, não fales disso a ninguém, guarda‑o para ti; eu farei o mesmo”, fui assaltado por uma citação desse poeta que trago comigo há décadas. Não resisto citá‑la em alemão, tantas são as vezes que a rezo em surdina: “Was du wirklich liebst, das bleibt dir”. (“Aquilo que deveras amas, conserva‑o para ti.”) É disso que trata a Antígona com que me deparei nesse ensaio de palco. Trata do Amor e do Segredo, seu pedagogo."
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Francisco Morão Dias
Uso as palavras de outros para descrever aquilo que vi, porque nelas vejo reflectida a minha percepção da história. Antígona, mostra-nos até onde vai o orgulho do Homem, até onde vai a ânsia no poder e como isso lhe transmite a sensação de ser Deus. Mostra-nos também que por muito que a maioria se vergue ao medo soberano, existe sempre alguém disposto a escapar-lhe e a fazer o que é certo, sob qualquer penitência que lhe seja imposta!
Ironicamente é um cego que mostra a Creonte que está errado, "mostrara‑lhe, na cegueira, o caminho da visão.", acho brilhante a frase. Dizem que pior cego é aquele que não quer ver e muitas vezes a raiva e arrogância conduzem-nos a um final que nem sempre nos é perdoado, porque quando nos arrependemos pode ser tarde demais como foi para Creonte...
No dia Mundial do Teatro, o TNSJ não só nos presenteou com entradas grátis para Antígona, como também nos "ofereceu" (neste caso não foi literal) um concerto soberbo.
Confesso, não conhecia Aldina Duarte, nem sequer tinha ouvido falar, mas a Muse of Hell tinha reservado bilhetes para "Mulheres ao Espelho" e decidi alterar também a minha reserva de teatro, para poder ver as duas coisas... tenho de agradecer-lhe também a ela, sempre atenta...
Durante o concerto, fiquei só, naquela sala, a assistir a Aldina Duarte (voz), Paulo Parreira (guitarra portuguesa) e Carlos Manuel Proença (viola). Eles os 3 a contaram aquela que podia ser a minha história, a minha vida, os meus sentimentos... abri o meu coração e deixei entrar a saudade daquele fado... a eterna saudade do que foi e não voltará a ser (como já escrevi algures). Falo por mim... eu estive a ver o meu reflexo no espelho daquelas músicas. No final do concerto, de sonhos perdidos na imensidão do tempo, eu sentia-me feliz, porque do que foi ficaram estas palavras, que cantadas soam tão bem!
Agradeço à S. o convite que me deixou e espero que esteja a aproveitar ao máximo o merecido descanso!
Deixo alguns excertos dos fados que muito me tocaram.
"Agora que não me dás nada, dás-me um pouco de paz."
"Se te querias ir embora, não ganhastes com a demora, de partires mais culpado"
"O amor não se desata e a tua paixão morreu, mas a minha não se mata"
Fotografias retiradas do Manual de Leitura de Antígona TNSJ